Vigilância Epidemiológica

Tularemia

Descrição

É uma enfermidade infecciosa aguda, descrita em animais pela primeira vez em 1910, cujo relato da primeira infecção humana foi em 1914. É uma doença de gravidade moderada, podendo se manifestar, quer como doença localizada, quer como doença sistêmica. Sua importância está relacionada à possibilidade de seu agente ser utilizado como arma biológica.

Agente etiológico

Bactéria Gram-negativa, denominada Francisella tularensis. Descreve-se duas cepas com virulências diferentes: cepa Jellison A, descrita somente na América do Norte, mais patogênica para o homem, e a cepa Jellison B, de distribuição mais ampla, descrita na Ásia, Europa e América do Norte. Contudo, é menos patogênica para o homem. 

Reservatório

Mamíferos silvestres.

Vetores

Carrapatos do gênero Dermacentor, que incluem o carrapato da madeira, Dermacentor andersoni, carrapato do cachorro, D. variabilis, carrapato texano D. amblyomma americanum e, com menor freqüência, a mosca do veado, Chrysops discalis e, na Suécia, o mosquito Aedes cirineus. Além disso, outros artrópodos também têm sido associados à transmissão, tais como: pulgas, piolhos, mosquitos e moscas. 

Modo de transmissão

Através da picada dos vetores, e também por inoculação da pele, do saco conjuntival ou da mucosa orofaríngea com água contaminada, sangue ou tecidos, ao manipular o corpo de animais infectados e abertos (despelar, e viscerar ou praticar necropsia); ao inalar ou ingerir carne mal cozida de animais hospedeiros infectados; ingestão de água contaminada; ao inalar poeira de terra, grão ou ferro contaminados. Em raras ocasiões, por mordeduras de animais, cuja boca esteja contaminada por ingerir algum animal infectado e também por ou através da pela pele, couro ou garras. 

Infecções acidentais em laboratórios são comuns, e com frequência se apresentam sob a forma de pneumonia ou tularemia tifóidica. 

Período de incubação

Varia de 1 a 14 dias, sendo o mais comum entre 3 e 5 dias. Esta variação depende da virulência da cepa infectante e da quantidade de bactéria inoculada. 

Período de transmissibilidade

Não se transmite de pessoa para pessoa. Caso não seja introduzida a antibioticoterapia, o agente infeccioso pode estar presente no sangue durante as primeiras duas semanas de doença, e nas lesões, durante um mês ou mais. As moscas são infectantes durante 14 dias, e os carrapatos durante toda a sua vida (cerca de dois anos). A carne de coelho, conservada em congelador à temperatura de -15°C, tem permanecido infectante por mais de três anos. 

Susceptibilidade e imunidade 

Não há diferença de sexo, raça ou idade, em relação à suscetibilidade à moléstia. 

Aspectos clínicos e laboratoriais

Manifestações clínicas

As manifestações clínicas variam de acordo com a via de introdução e a virulência do agente patógeno. Com maior frequência, assume a forma de uma úlcera indolor no local de penetração do microorganismo, acompanhada de aumento de volume dos gânglios linfáticos regionais (tipo ulceroganglionar). Pode suceder que não apareça a úlcera primária, mas apenas um ou mais gânglios linfáticos aumentados e dolorosos que podem supurar (tipo ganglionar). A ingestão do micro-organismo pela água ou alimentos contaminados, pode causar uma faringite dolorosa (com ou sem úlceras), dor abdominal, diarreia e vômitos (tipo orofaríngeo). A inalação do material infectante pode seguir-se a um ataque pneumônico, ou a uma síndrome septicêmica, a qual, sem tratamento, tem uma taxa de letalidade de 30 a 60% (tipo tifoidico). Os microorganismos, que circulam na corrente sangüínea, podem localizar-se no pulmão e nos espaços pleurais (tipo pleuropulmonar). A infecção pode ser introduzida, também, pelo saco conjuntival, e, quando isto ocorre, gera uma conjuntivite purulenta dolorosa e linfadenite regional (tipo oculoganglionar). A pneumonia é uma complicação que pode aparecer em qualquer forma clínica, e impõe pronto diagnóstico e tratamento específico imediatos, para evitar o óbito. 

Diagnóstico diferencial

Deve ser feito com peste, e muitas outras infecções causadas por estafilococos e estreptococos, como a linforreticulose benigna (febre do arranhão do gato) e esporotricose. 

Diagnóstico laboratorial

O diagnóstico mais comum é feito mediante dados clínicos e epidemiológicos, entretanto, pode-se confirmar através do aumento de anticorpos séricos específicos que aparecem na segunda semana da doença. Pode haver reações cruzadas com Brucella. O diagnóstico rápido se faz através de estudo do exsudato da úlcera, do material da aspiração de gânglios linfáticos e outras amostras clínicas, por meio da prova de anticorpos fluorescentes. A biopsia diagnóstica de gânglios linfáticos, com infecção aguda, será realizada somente quando o paciente encontrar-se sob a proteção de tratamento específico com antibióticos, pois a coleta de material, geralmente, induz a bacteremia. As bactérias patógenas são identificadas através de cultivo em meios especiais, ou por inoculação de animais, em laboratório, com material das lesões, sangue e catarro. Deve-se tomar cuidados especiais, para evitar a transmissão em laboratório de microorganismos muito virulentos por meio de aerossóis, razão pela qual a identificação deve ser realizada somente em laboratórios especializados. Em quase todos os casos, o diagnóstico é feito por técnicas sorológicas. 

Tratamento

Estreptomicina ou gentamicina, durante 7 a 14 dias, são os medicamentos de preferência. As tetraciclinas e o claranfenicol são bacteriostáticos e eficientes, mas são de segunda escolha (período não menor do que 14 dias), por apresentarem mais casos de recaídas do que os anteriores. A aspiração, a incisão e a drenagem ou coleta de material de biopsia de gânglio linfático inflamado, podem disseminar a infecção e nestes casos, é necessário, como referido, usar a proteção à base de antibióticos. 

3. Vigilância epidemiológica

Objetivos

• Diagnóstico e tratamento precoce dos casos, para evitar complicações e óbitos. 

• Identificação da fonte de infecção, para adoção de medidas de controle e desinfecção concorrente. 

Definição de caso 

Suspeito 

Paciente, com evidência ou história de exposição a vetor, tecidos de hospedeiros mamíferos da Francisella tularensis, ou exposição de água potencialmente contaminada, associado a uma das seguintes manifestações clinicas: 

• úlcera cutânea com linfadenopatia regional (Ulceroglandular) 

• linfadenopatia regional (Glandular) 

• conjuntivite com linfadenopatia preauricular (Oculoglandular) 

• estomatite ou faringite ou tonsilite e linfadenopatia cervical (Orofaríngea) 

• dor abdominal intestinal, vômito e diarréia (Intestinal) 

• doença pleuropulmonar primária (Pneumônica) 

• doença febril sem sinais e sintomas localizados prévios (Tifóidea) 

Critério diagnóstico presuntivo (laboratorial) 

- Caso suspeito, que apresente títulos elevados de anticorpos séricos do antígeno F. tularensis (sem mudança documentada de quatro vezes ou mais), em um paciente com nenhuma história de vacinação contra a tularemia, ou 

- Caso suspeito, com detecção de F. tularensis, em espécime clinica, através de ensaio de imunofluorescência. 

Confirmado laboratorialmente 

• Isolamento de F. tularensis em espécimes clínicas, ou 

• Títulos de anticorpos séricos quatro vezes ou mais elevados para o antígeno F. tularensis

Classificação de caso 

Provável: um caso clinicamente compatível, com resultados laboratoriais indicativos de infecção presuntiva. 

• Confirmado: um caso clinicamente compatível, com resultados laboratoriais confirmatórios. Clínico-Laboratorial: isolamento e/ou sorologia e/ou histopatologia. 

Notificação

A ocorrência de casos suspeitos desta doença requer imediata notificação e investigação, por se tratar de doença grave e sob vigilância. Mesmo casos isolados impõem a adoção imediata de medidas de controle, visto se tratar de evento inusitado. 

Por ser uma doença passível de uso indevido como arma biológica, todo caso suspeito deve ser prontamente comunicado por telefone, fax ou e-mail às autoridades sanitárias superiores. 

Investigação epidemiológica

Imediatamente após a notificação da existência de caso suspeito, de um ou mais casos da doença, deve-se iniciar a investigação para esclarecimento diagnóstico, e permitir que as medidas de controle possam ser adotadas em tempo oportuno. 

Preencher todos os campos da Ficha de Notificação do SINAN, relativos aos dados gerais, notificação individual e residência.Não se dispõe de Ficha Epidemiológica de Investigação para este agravo no SINAN, devendo-se elaborar uma específica para este fim, contendo campos que coletem os dados das principais características clínicas e epidemiológicas da doença (ver roteiro de investigação de casos e epidemias, no Capítulo 2 deste Guia). 

Instrumentos disponíveis para controle

Na antiga União Soviética, aplicava-se extensivamente por via intradérmica, através do método de escarificação, as vacinas preparadas com microorganismos vivos atenuados, mas nos Estados Unidos o seu uso é limitado aos grupos expostos ao risco ocupacional. Para o pessoal de laboratório, que trabalha com o microorganismo, está disponível uma vacina viva atenuada, derivada de uma cepa não virulenta viva. A eficácia e efetividade deste imunobiológico ainda estão sob estudos e sua futura disponibilização ainda não está determinada. 

Quando um paciente é diagnosticado, o isolamento, precaução com as secreções e sangue, desinfecção concorrente, são medidas que devem ser adotadas. 

Fonte: 
Guia de Vigilância Epidemiológica - Volume 2
FUNASA - Fundação Nacional de Saúde

 

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