BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO

Ano XI - Número 11                                                       Dezembro/2000

 EDITORIAL

 As equipes de saúde devem manter-se mobilizadas para o adequado controle de doenças transmissíveis sujeitas à vigilância epidemiológica.

 No presente momento é imperativo se alertar para a possível sobreposição de quadros potencialmente epidêmicos como dengue, sarampo ou rubéola, a forma hemorrágica de dengue, a doença meningocócica, entre outros agravos que possam ser considerados inusitados ou em que seja imperativo vigiar e investigar. Uma revisão de tendências encontra-se em “Trajetória das Doenças Infecciosas: da eliminação da poliomielite à reintrodução da cólera[1](formato pdf).

 A investigação, o diagnóstico diferencial e manutenção de ágil vigilância laboratorial dessas doenças que se incluem entre as de notificação compulsória em Campinas[2] são medidas que se mantêm portanto recomendadas.

 

NESTE NÚMERO:

Dengue Sarampo Meningites  Raiva

 

  Boletim Epidemiológico de Campinas na internet:

http://www.campinet.sp.gov.br/saude

 

  CENTRO MUNICIPAL DE REFERÊNCIA EM CONTROLE DE ZOONOSES DE CAMPINAS

Telefone 3245-1219

BIP 41-71-695  central 3243-9777

 

DENGUE

Há uma expansão contínua da endemia de dengue no planeta, através da incontida disseminação dos quatro sorotipos de vírus circulantes, acometendo as populações do cinturão tropical[3] em surtos e epidemias que se esgotam pelo acometimento dos susceptíveis. Há uma preocupação crescente com a falência dos métodos tradicionais de intervenção na falta de vacinas eficazes, ineficácia global dos programas consumidores de muito recurso, e a necessidade fundamental de se intervir nos criadouros urbanos[4] do principal inseto transmissor.
No Brasil[5] e Estado de São Paulo[6] esse padrão de disseminação aparece acometendo um número progressivamente crescente de municípios. A situação vem se agravando porque há não só essa ampliação da endemia em surtos recorrentes, como aumento do risco de formas hemorrágicas a partir da circulação e recirculação dos sorotipos 1 e 2 no país. Uma ampla revisão da “Epidemiologia e medidas de prevenção do dengue” foi publicada no Informe Epidemiológico do SUS[7].
Em Campinas o desenvolvimento do “projeto dengue[8], com a mobilização das equipes de campo, dos profissionais de saúde e da população em geral tem obtido êxito em manter um bom nível de controle após a epidemia de 97/98, quando se registrou no período de verão pouco mais de mil casos. Em 1999 e 2000 a ocorrência de autoctonia restringiu-se a 70 e 59 casos respectivamente, sendo que neste período crítico que se inicia não se detectou casos até novembro.
Os esforços neste momento dão-se em duas diretrizes fundamentais: vigilância ativa da circulação dos vírus do dengue em todos os serviços e laboratórios, com produção contínua de investigação de suspeitos e de casos de febre a esclarecer, e a vigilância entomológica precisa, mês a mês, com a confecção dos índices de infestação por área de cobertura de Centro de Saúde (Índice de Breteau).

 

SARAMPO

Em recente encontro anual sediado este ano no Brasil - Foz do Iguaçu (PR)[9], o Grupo Assessor de Doenças Preveníveis por Vacinas da Organização Panamericana de Saúde (OPS) acredita ser possível a erradicação do sarampo nas Américas ainda para o ano de 2.000 conforme foi definido na  reunião da XXIV Conferência Sanitária Panamericana em 1994, ano também da Certificação de Erradicação da Poliomielite nas Américas.

O sarampo é uma doença de alta transmissibilidade em que, para se interromper a circulação do vírus, é necessário manutenção de altas coberturas vacinais (maiores que 95%), de forma homogênea. Após uma campanha de vacinação, é esperada inicialmente uma baixa ocorrência da doença, seguida de recrudescência, devido a acúmulo de suscetíveis, por coberturas vacinais inadequadas, por fluxo migratório de pessoas provenientes de locais com baixa incidência de sarampo ou baixas coberturas vacinais, ou ainda por falha primária da vacinação.

Mundialmente vive-se situação de endemia de sarampo em países subdesenvolvidos onde as coberturas vacinais são baixas e inadequadas, ou em países desenvolvidos,  sob a forma de surtos como os EUA, ou na França, Alemanha, Japão e Itália onde não se realizam vacinações de rotina contra o sarampo.

No Brasil, até o início da década de  90, o sarampo apresentava-se como uma doença endêmica com picos epidêmicos a cada 2-3 anos. Em 1992, com a implantação do Plano Nacional de Eliminação do Sarampo, foi propiciado um controle mais efetivo com atividades de vacinação e obtenção de alta cobertura vacinal no país (96,7%).

Quatro anos após esse controle da doença, houve seu recrudescimento sob a forma de surtos de grandes proporções nas regiões sudeste e sul  (SP, SC e PR), entre 1996 e 1997, para propagar-se a outros estados do nordeste (PE), centro-oeste e norte, em 1998.

Apesar do Estado de São Paulo[10] ter realizado duas campanhas de vacinação indiscriminada contra o sarampo (1987 e 1992), ele foi acometido por uma grande epidemia em 1997, com início na Grande São Paulo, e que logo se alastrou para o interior, contabilizando-se 23.909 casos confirmados no estado (69,13 casos por 100.000 habitantes), com 282 casos em Campinas (30,67 casos por 100.000 habitantes) (CVE)[11].

Houve oscilação de coberturas vacinais nestes anos que antecederam a epidemia, que não foram homogêneas em todo o estado, propiciando acúmulo de suscetíveis. Além disso, houve o esperado deslocamento de faixa etária, onde, em Campinas a faixa de adultos jovens teve grande importância nessa epidemia.

Na campanha de multivacinação de 2.000, houve o ajuste das medidas de controle, realizando-se a campanha de seguimento[12], quando se vacinou novamente as crianças menores de 5 anos com o intuito de imunizar os susceptíveis remanescentes. Incrementou-se também  vacinação de grupos de risco, como por exemplo trabalhadores na construção civil.

Dados atuais confirmam a possibilidade da erradicação. Se em 1994, havia meio milhão de casos de sarampo, em 2.000 temos registrado menos de 830 casos nas Américas, localizados no Haiti e na República Dominicana. No Brasil, os esforços de vigilância ativa são realizados e neste ano somente 48 casos foram confirmados em uma população de 160 milhões de habitantes.

O Centro Nacional de Epidemiologia[13] alerta que para se obter êxito é necessário que os governantes mantenham o Plano de Eliminação do sarampo na agenda de prioridades.

 

MENINGITES

Após bem sucedida campanha de vacinação contra a meningite meningocócica A-C em 1996, evidenciada pelos impactos positivos na incidência da doença em Campinas nos anos subseqüentes, vemos em 2000 uma tendência ao crescimento do sorogrupo C, devido ao fato da vacina utilizada, constituída de polissacárides capsulares, apresentar uma proteção de duração limitada (2-3 anos).

De um modo geral, a doença meningocócica está no patamar de controle no Estado de São Paulo[14] e na região de Campinas.  A letalidade, de aproximadamente 20%, está associada aos casos graves de meningococcemia, na maioria do sorogrupo B, para o qual não há vacina eficaz até o momento.

Outras meningites[15] adquirem importância epidemiológica devido às diferentes etiologias com sobreposição de quadros clínicos e medidas de controle diversas. Portanto, a investigação clínico-epidemiológica e o indispensável componente laboratorial, continuam claramente indicados.

MENINGITES E REAÇÃO VACINAL ANTI-AMARÍLICA

Em fevereiro deste ano foi desencadeada uma campanha de vacinação em massa contra a febre amarela na região, que atingiu 68,5% de cobertura, tendo-se vacinado 2.065.000 pessoas nos 42 municípios abrangidos. Essa campanha foi indicada pelo risco de início de transmissão com a confirmação de febre amarela em residente no município, contraída na região da Chapada dos Veadeiros (GO) no mês de janeiro de 2000. O surto de febre amarela nessa região contextualiza-se na ocorrência epidêmica da doença no Brasil, Peru e Bolívia[16].

Concomitante a essa vacinação observou-se um aumento de casos de meningite linfomonocitária com características  semelhantes às de etiologias virais[17], de curta duração e  evolução benigna, que suscitou a hipótese de correlação epidemiológica, e portanto tratar-se de evento adverso pós-vacinal.

Além dessas meningites que totalizaram 279 casos no período da campanha, houve um óbito em Americana  (SP) cinco dias após recebimento da vacina. Entre todos os exames realizados na investigação desse óbito, a técnica de PCR nos tecidos  revelou a presença de vírus vacinal, uma das hipóteses da causa do óbito. Este caso, um em mais de dois milhões de doses aplicadas, ocasionou a suspensão cautelar da vacinação em massa, mesmo porque já se obtivera cobertura vacinal significante contra a febre amarela. Considerando-se porém o risco de febre amarela, recomenda-se continuar a indicar a vacinação[18] para viajantes que se dirijam à área endêmica, posto que a letalidade por circulação nestas áreas continua alta.

A investigação epidemiológica tanto do óbito como das meningites não permitiu concluir-se em definitivo quanto à etiologia, porém há evidências de associação no caso dessas meningites, reforçada pela relação temporal, com um risco relativo 3,45 maior para os que tomaram a vacina.

Esse caso de Americana não seria inédito no Brasil: o primeiro teria ocorrido em dezembro de 1999, em Goiás. Também o Centro de Controle de Doenças dos EUA relata quatro óbitos com associação temporal à vacina contra a febre amarela, sendo dois com isolamento viral.

Investigações[19] estão sendo conduzidas em cepas vacinais da febre amarela para se verificar a possível reativação da virulência vacínica, o que poderia explicar tais eventos adversos.  

RAIVA

A raiva é considerada por muitos especialistas como uma das zoonoses de maior importância em saúde pública, não só por sua evolução letal, como também por seu elevado custo social e econômico. Estima-se que somente na América Latina[20], cerca de 800.000 pessoas são agredidas anualmente por animais, acarretando um gasto de aproximadamente 2.000.000 doses de vacina anti-rábica, somando-se ainda a danos físicos e perda de horas de trabalho.

No Brasil20, embora tenham sido envidados inumeráveis esforços para controlar a raiva animal e eliminar a raiva humana, esta continua a fazer vítimas e a comprometer a economia de muitas regiões.

Pode-se observar o desencadeamento de uma epizootia de raiva em animais herbívoros prioritariamente em bovinos  inicialmente identificada nas regiões noroeste do Estado do Rio de Janeiro e sudeste de Minas Gerais. Esta epizootia avançou sem mecanismos eficazes de controle e atingiu o Estado de São Paulo provavelmente no início de 1998.

Embora o governo estadual tenha desenvolvido ações de grande importância envolvendo as Secretarias de Saúde e da Agricultura – que é responsável pelo controle sanitário dos rebanhos de animais de produção – não se conseguiu impedir o avanço da epizootia que atinge a região de Campinas, sendo verificados os primeiros casos em animais no início do mês de junho do corrente ano.

Neste período, foram identificados no município 17 casos da doença em animais (4 eqüinos, 1 ovino e 12 bovinos) nos subdistritos de Sousas (1 caso) e Joaquim Egídio (16 casos).

Para que esta epizootia seja controlada é preciso que sejam desenvolvidas atividades conjuntas entre as Secretarias Municipais e Estaduais.

De acordo com determinação da Secretaria Estadual de Agricultura, é de responsabilidade de todo o proprietário de animais de produção, a vacinação contra a raiva. No Estado de São Paulo preconizam-se o uso de vacinas inativadas, com aplicação anual em todo o rebanho suscetível. Os animais primo-vacinados devem receber dose de reforço cerca de 30 dias após a primeira vacinação.

A fiscalização e controle desta vacinação são de responsabilidade dos técnicos do Escritório de Defesa Agropecuária – EDA – com sede regional no município de Campinas.

A estes técnicos cabe ainda o controle dos morcegos hematófagos, os transmissores da raiva para os animais herbívoros, mediante a captura e eliminação das colônias, ou então pela aplicação de produtos com ação anticoagulante em exemplares capturados isoladamente.

Às Secretarias Municipais de Saúde cabe a responsabilidade de manter o sistema de vigilância em estado de alerta, orientando a população quanto aos riscos de transmissão da doença, indicando tratamento de pré-exposição a todos os profissionais - médicos veterinários, tratadores e criadores - que tenham estreito contato com animais, e ainda indicando corretamente tratamento pós-exposição, de acordo com norma técnica vigente.

No município de Campinas, as equipes do Centro de Controle de Zoonoses, de vigilância em saúde do Distrito de Saúde Leste e dos Centros de Saúde de Sousas e Joaquim Egídio, desenvolveram atividades de bloqueio de foco em animais domésticos, ampla orientação à população local e tratamento de todos os envolvidos em acidentes com animais (positivos ou suspeitos), encaminhamento de amostras para diagnóstico laboratorial e apreensão de animais errantes.

Em recentes encontros técnicos ocorridos no município de Campinas, as conclusões indicaram que a epizootia ainda não se encontra controlada, sendo necessário que as equipes de vigilância de todo o município permaneçam atentas aos riscos de transmissão da doença, notificando todos os animais suspeitos aos órgãos competentes e encaminhando corretamente as pessoas envolvidas em acidentes com mamíferos domésticos ou selvagens para tratamento vacinal profilático.

  Equipe Responsável por este Boletim:

Ricardo Alves Cocolisce
Carlos Eduardo Cantúsio Abrahão
Antônio Carlos Coelho Figueiredo
Naoko Yanagizawa Jardim da Silveira

  Notificação Imediata - 24 horas

BIP - Central: 3243-9777   -    Código 41.71.686

 

COORDENADORIAS REGIONAIS DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE

Fones: Norte 3242-1186               Sul: 3273-5055  e 3273-5999

               Leste: 3254-7060 e 3254-2633             Sudoeste: 268-6233 e 268-6234

Noroeste:  268-6255 e 268-6244

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